Biquíni em parque de Higienópolis divide opinião de usuários
sexta-feira, 29 de outubro de 2010Fazia sol, após vários dias de frio, e Marilia Balbi, 58, decidiu se deitar no gramado do parque Buenos Aires, em Higienópolis (região central de São Paulo). De biquíni.
Pouco depois, foi interrompida pelo vigilante, que disse que não poderia continuar ali com “roupas íntimas”. Ela argumentou que ficaria só 15 minutos e ele se foi.
Quando voltou, estava acompanhado de quatro guardas metropolitanos, que a levaram para ler as normas do parque na administração. Portaria 28/02, artigo 5º, inciso 17: é proibido “tomar sol de biquíni ou sunga”.
A norma faz parte de apostila de treinamento entregue a todos os vigilantes do parque que, em última instância, decidem quem está infringindo uma regra ou não. Cada parque tem regulamento próprio; no Ibirapuera, por exemplo, é comum mulheres tomarem sol de biquíni.
Usuários dizem que é corriqueiro ver mulheres de short e a parte de cima do biquíni e homens sem camisa no Buenos Aires. A área tem 25 mil m2 e Marilia diz que foi tomar sol num canto do gramado, “longe dos passantes”.
“Chama muito a atenção e os moradores reclamam”, justificou um dos vigilantes. “As babás já reclamam dos idosos sem camisa”, disse outro. O parque tem oito vigilantes e 35 proibições.
“Uma intimidação pública lamentável e preconceituosa. Existe alguma lei neste país que proíbe tomar sol de biquíni em parques públicos?”, questiona Marilia.
Dos 15 frequentadores ouvidos pela reportagem do jornal Folha de S. Paulo na tarde de anteontem, cinco –entre 27 e 77 anos– concordavam com o veto do biquíni. Quatro deles achavam que também os homens sem camisa deveriam ser proibidos ali.
Os argumentos mais comuns são a “inadequação” da roupa, em um parque “pequeno” e frequentado, sobretudo, por crianças e idosos.
Esse é também o argumento do supervisor do parque, Eduardo Panten. “Biquíni ou sunga são inadequados. Nossa finalidade é evitar o conflito, mas não há discriminação ou constrangimento. É que a sociedade é conservadora.”
Já os favoráveis ao uso do biquíni –entre 22 e 67 anos– argumentam que o ambiente ali é ideal para tomar sol em contato com a natureza e que os trajes devem ser definidos pelo bom senso de cada um.
“Proibir é um falso moralismo”, dizem o engenheiro Rivaldo de Paula, 67, e a secretária Ivani Monteiro, 59.
O sociólogo esloveno Marko Ferk, 32, que mora perto do Buenos Aires há três meses, diz que em seu país há mais liberdade e, em cidades da Alemanha e Espanha, é comum ver as mulheres até de “top less” nos parques.
“As leis nascem de uma necessidade; se a cultura e as pessoas acham que tem que proibir, tudo bem.”
O secretário do Verde e do Meio Ambiente, Eduardo Jorge, disse em nota que “não é contrário ao uso de biquíni nos parques” e enviará carta ao conselho gestor do Buenos Aires “sugerindo que este item seja reavaliado”.
DEPOIMENTO
“Passei por uma violência moral, sem necessidade, na cidade de São Paulo, só porque queria tomar sol, depois de vários dias nublados.
Era segunda-feira de manhã, fui ao Parque Buenos Aires, em Higienópolis, conferir o horário da aula de Liang Gong que voltaria a fazer, agora com o tempo quente.
Moro perto do parque, na rua Bela Cintra, Consolação, e quando cheguei no parque, vi aquele gramado lindo e outras pessoas ao sol, e como estava de biquíni por baixo do short, resolvi tomar 15 minutos de sol recomendados pelo médico.
No gramado, longe dos passantes, pude relaxar uns minutinhos, mas minha alegria durou pouco, fui interrompida pelo guarda dizendo que não podia tomar sol com roupas íntimas, fiquei pasma!
‘Não, seu guarda, estou de biquíni e daqui a pouco vou embora!’ O guarda saiu dali, pensei que ele havia concordado! Mas para meu susto, foi buscar reforço numa ronda da guarda metropolitana que passava de carro pela av. Angélica, e, quando percebi, estava rodeada por uns quatro guardas no gramado, todo mundo olhando.
Uma intimidação pública lamentável e preconceituosa; um dos guardas, constrangido, até comentou que no Parque do Ibirapuera era permitido tomar sol de biquíni!
E fomos ler as normas do parque Buenos Aires, que estavam escondidas na sala da administração e colocada às pressas lá fora, no bebedouro, porque nunca tinha lido nada parecido por lá! Numa das linhas do cartaz: “Não pode tomar sol de sunga…” Mas, enquanto passava pela “Mãe de Brecheret”, encontrei vários homens tomando sol, sem camisa e de calção, e gostaria que continuassem a tomar o sol, como o fazem há anos, mas as mulheres também querem tomar sol!
Existe alguma lei neste país que proíbe tomar sol de biquíni em parques públicos? Cada parque público é gueto de um bairro? E seria preciso chamar a polícia da rua, como fizeram, um pelotão de quatro guardas, mais viatura, como se estivesse cometendo o maior crime…! Achei o fato severamente conservador, preconceituoso e intimidador; e ainda demonstra que esta cidade ainda tem muito que aprender sobre civilidade e democracia.
Já tomei sol, de biquíni, no parque do Ibirapuera, e no Central Park, em Nova York, porque todos que vão a um parque vão para relaxar, descansar das pressões, para iniciar o dia com saúde! Assim como no Ibirapuera e Central Park toma-se sol onde quiser; e para ficar mais à vontade de biquíni, no Ibirapuera, normalmente as pessoas vão para o gramado, às margens do lago, próxima à área do Planetário, assim como no gramado livre para piqueniques no Central Park, NY.
E como no gramado do Parque Buenos Aires, que eu já havia visto outras mulheres por lá tomando o sol, e achei a ideia saudável! Assim como a cidade de Paris, no verão, a prefeitura coloca espreguiçadeiras à beira do rio Sena para os franceses tomarem sol, e de biquíni para quem quiser!
São Paulo não pode ficar com estas prática moralistas nos parques públicos e intimidação à mulher! Sofri o que se chama de violência moral! Repressão faz mal para a saúde pública, porque hoje acordei com imensas dores no corpo, tal o susto que passei no Parque Buenos Aires!
Fonte: Folha Online